Justiça anula cláusula abusiva em contrato de pacote turístico
A juíza titular do Juizado Especial Cível do Guará declarou nula, por abusividade, cláusula de contrato de pacote turístico que previa retenção de todo o valor já pago em caso de desistência do consumidor. A magistrada rescindiu o contrato celebrado entre as partes e determinou a restituição de parte da quantia paga pelo autor, após o desconto da multa de 10% do valor contratado.
O autor relata que em outubro de 2017 comprou junto à empresa de turismo ré um pacote denominado “Prive Férias Premium” pelo valor de R$ 4.400,00. Quanto pediu a rescisão do contrato, a empresa impôs, como multa, a retenção integral do valor já pago. Como não concordou com a medida, ele requereu a rescisão do contrato firmado com a declaração de abusividade da sua cláusula quinta, além de restituição do valor de R$ 1.560,00 (valor resultante da aplicação de multa no montante de 10% do valor pago).
A empresa ré alegou que no momento da contratação o autor tinha plena ciência dos encargos e valores que incidiriam em caso de rescisão, em especial a multa no importe de 21,42%. Afirmou, ainda, que encaminhou termo de distrato ao requerente, mas este não se manifestou. E, por fim, pediu que o autor fosse obrigado ao pagamento do valor de R$ 739,65 em razão das parcelas não pagas do contrato.
Na sentença, a juíza verificou que a cláusula quinta do contrato celebrado entre as partes prevê que o cancelamento antecipado do mesmo implicaria na cobrança de 21,42% do valor total do contrato, a título de compensação pelos custos administrativos e comerciais. Para a magistrada, “tal cláusula reputa-se flagrantemente abusiva e violadora da boa-fé a que devem se subordinar as relações consumeristas, nos termos do art. 51, inc. IV, do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que as cláusulas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade são nulas de pleno direito”.
A argumentação continua no sentido de que “permitir a retenção de 21,42% (vinte e um vírgula quarenta e dois por cento) do valor total do contrato, quando a demandada não comprovou qualquer prejuízo ou mesmo utilização dos serviços pelo requerente, seria possibilitar enriquecimento indevido das empresas de turismo, o que não se admite, até mesmo porque as cláusulas estipuladas desconsideram a desigualdade da força econômica das partes envolvidas, bem como a natureza do contrato entabulado, notadamente de adesão”.
A juíza ponderou, por outro lado, que devido ao fato de o pedido de rescisão ter sido feito pelo consumidor é devida a retenção e parte do valor pago, uma vez que “não há qualquer ilegalidade na retenção de valores a título de multa, que servirão para compensar eventuais prejuízos sofridos pela requerida, desde que se dê nos termos da lei”.
Por fim, a magistrada entendeu razoável a aplicação de multa compensatória de 10% (dez por cento) sobre o valor que já havia sido pago, “como suficiente para reembolsar a requerida por eventual prejuízo decorrente da rescisão unilateral, especialmente considerando que o requerente não chegou a fazer uso do pacote fornecido”.
Ela concluiu registrando que “o autor deixou de realizar o pagamento das parcelas por haver solicitado a rescisão contratual e não ter concordado com os termos do distrato, não podendo ser compelido a pagar por eventuais meses inadimplidos, uma vez que a questão vinha sendo resolvida administrativa e judicialmente, não podendo o consumidor ser compelido a firmar distrato baseado em cláusulas abusivas”.
Cabe recurso da sentença.
Processo Judicial Eletrônico: 0706046-23.2018.8.07.0014