Desde 2000
Todas as manhãs informando o operador do direito
ADVOGADOS CORRESPONDENTES
22
Jul

Justiça mantém sentença de réu condenado por provocar aborto

Por unanimidade, os magistrados da 2ª Câmara Criminal negaram provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público contra a sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva para um jovem, a fim de aplicar a medida socioeducativa pelo cometimento do ato infracional análogo ao crime de provocar aborto sem o consentimento da gestante (previsto no artigo 125 do Código Penal).
 
No recurso, o Parquet pediu a reforma parcial da sentença a fim de aplicar a sanção pela prática do ato infracional análogo ao crime previsto no artigo 148, do Código Penal, alegando que a prática dos delitos decorreu de desígnios autônomos, uma vez que o cárcere privado da vítima não se caracterizou como um meio para o delito de aborto provocado por terceiros, requerendo, portanto, o afastamento do princípio da consunção.

De acordo com o processo, acompanhado de mais duas pessoas, o adolescente privou a vítima de liberdade, depois de colocá-la em cárcere privado. Após, os três ameaçaram a vítima, causando sofrimento mental, o que resultou no aborto da gestante sem o consentimento dela.
 
Na sentença, apontou o MP, o juiz singular ressaltou que tudo indicava que a intenção do jovem era de causar o aborto na vítima, impedindo o reconhecimento do ato infracional análogo ao crime de cárcere privado, pois este foi o meio para o resultado pretendido.

Para o relator da apelação, juiz Waldir Marques, ficou claro que a intenção do acusado em manter a vítima no interior de uma residência não configurou o delito previsto no artigo 148 do Código Penal, não ficando demonstrado o elemento subjetivo em manter a vítima em cárcere privado.

De acordo com o processo, o magistrado analisou três fatos imputados ao adolescente. No primeiro, sobre cárcere privado, pois segundo os autos, no dia 5 de abril de 2019, após o horário do almoço, na Rua Benedito da Silva, em Eldorado, o adolescente e as duas pessoas que o acompanhavam colocaram a vítima em cárcere privado, privando-a de sua liberdade.

No segundo, sobre tortura majorada, de acordo com o processo, nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, com vontade livre e consciente e junto com outras duas pessoas, o adolescente constrangeu a vítima, gestante, com emprego de grave ameaça, causando-lhe sofrimento mental, para provocar ação de natureza criminosa (aborto).

No terceiro, sobre aborto sem consentimento da vítima, narram os autos que, nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, junto com outras duas pessoas, o adolescente provocou o aborto, sem o consentimento da vítima gestante.

O magistrado destacou que é inegável o nexo de dependência entre as condutas relacionadas ao aborto sem consentimento da gestante e o cárcere privado, eis que, de acordo com a prova colhida nos autos, foi necessária a segunda conduta para que se atingisse o resultado almejado na primeira.

“É inconteste, de acordo com relato da vítima, que a coação para a ingestão dos medicamentos abortivos se deu também em razão de sua manutenção em cárcere. Também se verifica que a gravidade do crime meio é bem menor do que a do crime fim, permitindo o reconhecimento do princípio da consunção”, disse o juiz.

No entender do relator, tudo indica que a intenção do jovem foi a realização do aborto na vítima, o que impede o reconhecimento do ato infracional análogo ao crime de cárcere privado como medida autônoma. “Tal conclusão se extrai do fato de o cárcere privado ter se dado por pouco tempo, exclusivamente enquanto havia a execução do aborto. Portanto, o reconhecimento do princípio da consunção é medida que se impõe”, completou.

Para o magistrado, o dolo no crime de sequestro ou de cárcere privado, embora genérico, é requisito indispensável para a consumação da infração, e consiste na vontade livre e consciente do autor em privar alguém da sua liberdade de locomoção. O relator defende que, dada as especificidades da ação delitiva em voga, não comporta o concurso material entre cárcere privado e aborto causado por terceiros, uma vez que a restrição da liberdade da vítima ocorreu durante a ação da conduta do delito previsto no art. 125, do Código Penal.

“Assim, deve ser mantida a decisão de primeiro grau, eis que a restrição da liberdade da vítima foi crime meio, ou seja, ante factum impunível, para a prática do delito de aborto provocado por terceiros. Por tais fundamentos, nego provimento ao recurso”, concluiu.

O processo tramitou em segredo de justiça.

Últimas Notícias