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28
Jun

Tratamento de migrantes em privação de liberdade tem novas regras

Com o objetivo de assegurar os direitos das pessoas migrantes em conflito com a lei, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, durante a 89ª Sessão Virtual encerrada na sexta-feira (25/6), novos procedimentos para tratamento delas. De acordo com o relator do ato normativo n. 0009272-52.2017.2.00.0000, conselheiro Mario Guerreiro, a necessidade de uma nova regulamentação surge a partir da revogação do Estatuto do Estrangeiro e sua substituição pela Lei 13.445/2017, chamada Lei de Migração.

O tema era regulamentado pela Resolução CNJ n. 162/2012 e, segundo o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, havia a necessidade de atualizar a norma, tanto pelo quantitativo de pessoas migrantes em estabelecimentos penais brasileiros como pela ausência de um tratamento uniforme da matéria no Poder Judiciário.

Além disso, a nova resolução foi baseada na Convenção de Viena e contou com pedido do Ministério da Justiça e Segurança Pública para adequar o envio de documentos à nova lei. “A nova legislação trouxe relevantes e substanciosas modificações sobre a temática, alcançando, inclusive, as práticas judiciais. Consolidou verdadeira mudança de paradigma na política migratória nacional”, destacou Mário Guerreiro.

Segundo o conselheiro do CNJ, a regulamentação aprovada traz procedimentos e diretrizes unificados na jurisdição penal, capazes de refletir o necessário respeito à cláusula do devido processo legal nos processos em que pessoa migrante figure como custodiada, acusada, ré ou condenada. Para elaborar a proposta, o DMF teve a colaboração técnica do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) por meio do programa Fazendo Justiça, que também irá produzir manual para apoiar a implementação da normativa.

O texto ainda recebeu contribuições do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), da Polícia Federal, da Secretaria Nacional de Justiça, da Defensoria Pública da União e do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania. “O normativo busca consolidar orientações aos órgãos do Poder Judiciário, a fim de estabelecer protocolos de atuação que promovam o atendimento aos direitos processuais e internacionais da pessoa migrante, previstos na legislação e reconhecidos pelo Estado brasileiro perante a comunidade internacional”, observou Guerreiro.

Ele explicou que a elaboração da nova resolução parte de conceito de pessoa migrante, baseado na Resolução n. 4/2019 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Segundo o conselheiro do CNJ, o texto observa os compromissos do Brasil com normas internacionais para prevenção do tráfico de pessoas e tratamento de refugiadas, além das regras previstas na Convenção de Viena sobre Relações Consulares, Regras de Mandela e Regras de Bangkok.

De acordo com o juiz auxiliar da Presidência com atuação no DMF, Gustavo Direito, a normativa é mais uma iniciativa do CNJ para garantir atenção aos mais vulneráveis dentro de um campo já marcado por estigma e marginalização. “Assim como ocorreu com a população indígena em 2019 e com a população LGBTI em 2020, o CNJ segue instrumentalizando o Judiciário por uma atuação que faça cumprir normativas nacionais e internacionais no campo da privação de liberdade.”

Audiências de custódia

Segundo Mário Guerreiro, “a resolução também traz diretrizes para a realização de audiência de custódia, nos moldes preconizados pela Resolução CNJ n. 213/2015, adaptando-as à situação da pessoa migrante”. A norma prevê, inclusive, o encaminhamento a programas de acolhimento e moradia, em caso de relaxamento do flagrante ou concessão de liberdade provisória, com a comunicação à autoridade judicial do local onde a pessoa passará a residir. O texto determina também a promoção, por tribunais e escolas de magistratura, de cursos destinados à qualificação funcional das equipes que atuam em unidades que atendem a migrantes.

A manutenção da posse dos documentos necessários ao exercício dos direitos, tais como passaporte ou documentos válidos de viagem, também é contemplado pelo texto que, de acordo com o conselheiro, observa o princípio estabelecido pela Resolução n. 4/2019 da CIDH. “A situação da mulher migrante é alvo de atenção, sendo respeitadas as normativas internacionais, com destaque para as Regras de Bangkok e a jurisprudência da Suprema Corte.”

A questão da maternidade transnacional, destacou o relator, também recebe atenção especial. “O que inclui a visibilização de outras vivências de maternidade, quando os filhos não acompanharam a mãe no movimento migratório e permanecem no país de origem ou de residência”, explicou. De acordo com o conselheiro, isso ocorre porque a maternidade não se resume ao contato e aos cuidados diretos com a criança, dada a pluralidade de experiências possíveis.

CNJ

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